#02 -HISTÓRIA DO FUSCA
- Yan Bernardo de Souza
- 27 de jul. de 2017
- 11 min de leitura

Nesse segundo post vamos abordar uma história muito interessante e cheia de controvérsias, a história do fusca que vamos dividi-la em 4 posts: Fusca a origem, Fusca no Brasil, Fuscas no mundo e as evoluções do fusca.
Fusca a origem
A história do fusca, ou melhor Volkswagen Sedan começa lá na Alemanha dos anos 30. O país era o que possuía a menor motorização de veículos da Europa. E por curiosidade o nome Volkswagen em alemão significa carro do povo. Nesta época Hitler havia ascendido ao poder, e estava comprometido com a modernização do país e a recuperação da economia, em principal dos empregos. Entusiasta por carros desde a juventude, Hitler via com entusiasmo a ideia de um carro do povo desde os tempos em que esteve preso, quando leu sobre Henry Ford, a linha de montagem e Ford modelo T. Para ele a ideia de um "carro do povo", fabricado por trabalhadores alemães e viajando pelo o país, era a exata realização da plataforma política de seu partido.
Assim estava decidido a financiar uma empresa estatal para produzir os automóveis que iriam trafegariam por suas recém-inauguradas Autobahns, com isso Hitler deu sinal verde para o projeto. Três projetos diferentes lhe foram oferecidos pelos engenheiros Josef Ganz, Edmund Rumpler e Ferdinand Porsche. Os dois primeiros eram judeus, e não agradaram a Hitler. Já Porsche era famoso pelo seu trabalho na Daimler, carros dos quais Hitler gostava, e, talvez mais importante, era amigo de Jacob Werlin, amigo e assessor para assuntos automotivos de Hitler.
Em meados de 1933, Werlin, que conhecia Porsche dos tempos da Daimler-Benz, intermediou o encontro de Porsche com Hitler. Neste encontro, Hitler mostrou-se bem informado sobre os projetos de Porsche na NSU e com opinião formada sobre o "carro do povo". Hitler tinha pronto uma lista de exigências a serem cumpridas por Porsche, caso o contrato fosse efetivamente firmado para produção do carro:
O carro deveria carregar dois adultos e três crianças (uma típica família alemã da época).
Deveria alcançar e manter a velocidade média de 100 km/h.
O consumo de combustível, mesmo com a exigência acima, não deveria ser menor que 13 km/litro (devido à pouca disponibilidade de combustível).
O motor que executasse essas tarefas deveria ser refrigerado a ar, pois muitos alemães não possuíam garagens com aquecimento, e se possível a diesel e na dianteira.
O carro deveria ser capaz de carregar três soldados e uma metralhadora.
O preço deveria ser menor do que mil marcos imperiais (o preço de uma motocicleta na época)


Alguns dos primeiros protótipos do carro feitos por Porsche
Hitler solicitou que Porsche transplantasse suas ideias para o papel, o que ele fez em 17 de janeiro de 1934. Ele encaminhou uma cópia para Hitler e publicou o seu estudo chamado "Estudo Sobre o Desenho e Construção do Carro Popular Alemão". Porsche descreveu a situação do mercado, as necessidades do povo alemão, sua convicção na viabilidade de um motor a gasolina e traseiro (ao contrário do que Hitler queria) e, principalmente, fez um estudo comparativo com outros carros alemães frente ao seu projeto, onde concluía pela inviabilidade de vender o carro por menos de 1.500 RM. Hitler leu o estudo, mas manteve-se irredutível quanto à questão do preço, o que preocupou Porsche.


Outro protótipo construído durante outra fase de desenvolvimento, já com mais cara de fusca, mas ainda coma ausência de para-choques e vidro traseiro
Após alguns discursos sobre o projeto, Hitler finalmente colocaria a Associação de Fabricantes de Automóveis Alemães (RDA, na sigla em alemão) encarregada da execução do projeto. Apesar dos temores de Porsche, Werlin o convenceu a aceitar a verba de vinte mil marcos por mês para desenvolver o projeto. Assim, em 22 de junho de 1934 o contrato foi assinado, e os equipamentos foram instalados na casa de Porsche em Stuttgart. A equipe de Porsche era liderada por Karl Rabe, e contava com o designer Erwin Komenda (responsável pelo desenho da carroceria), Franz Xaver Reimspiess (que desenvolveria o motor final e o logotipo VW), Joseph Kales, Karl Fröhlich, Josef Mickl, Josef Zahradnik, e o filho de Porsche, Ferry Porsche.
O prazo para desenvolver todo o projeto o prazo era bem curto, sendo de apenas seis meses. Em dezembro de 1934 o número de protótipos encomendados passou para 3, de acordo com a filosofia de Porsche. Embora o com o prazo curto, Porsche temia desagradar a Hitler e, portanto, em 1935, dois modelos ainda meio que rústicos estavam prontos. Com fundo de madeira e motores dois tempos de 850cc, os modelos eram um sedan de carroceria fechada esse chamado Versuch 1 (V1), ou "Protótipo 1", e um conversível, V2, feito para agradar o Führer, entusiasta por conversíveis.
Em 12 de outubro de 1936 os dois pré-protótipos, mais um com carroceria em aço (construídos com a ajuda da Daimler-Benz, formariam a Série W30) foram entregues à RDA para os testes (dois carros contavam com o motor que acabaria sendo o do Fusca). Em três meses cada um deles rodou cerca de 50 mil quilômetros, enfrentando todos os tipos de terrenos, durante uma rotina de testes seis dias por semana. Para satisfação de Porsche, o relatório final da RDA aprovava o projeto do carro. Os problemas ficaram apenas no freio, que ainda era a varão, e o virabrequim, que quebrava com frequência.


Protótipos do VW30
Em 1937 foram produzidos trinta modelos de uma versão revisada do projeto, incluindo modificações originadas nas baterias de testes anteriores. Produzidos pela Daimler-Benz (hoje controladora das marcas Mercedes Benz e AMG...Sim a Mercedes ajudou a fazer o fusca!) e financiados pela RDA, essa série ficou conhecida como VW30, e era muito parecida com o produto final, porém sem janela traseira e sem os para-choques. Esses modelos foram submetidos a uma bateria de testes ainda mais severa e chegando os trinta em conjunto a rodar 2,4 milhões de quilômetros nas mãos de membros da SS, a tropa de elite de Hitler.
Após testes tão completos, a estrutura do carro ficaria praticamente concluída, faltando apenas acertar os detalhes da carroceria. Entre 1936 e 1937 Porsche havia viajado para os Estados Unidos, onde acompanhou os processos de fabricação em série e linha de montagem. E Assim, de lá ele trouxe alemães habituados a trabalhar em Detroit (cidade onde ficava sedia a Ford Motor Company e outras grandes fabricantes americanas), que o ajudariam a viabilizar a fabricação em massa do projeto. Com essa ajuda, Erwin Komenda pôde então trabalhar no design final do carro. Ele fez uma maquete de pré-produção, em madeira e tamanho natural. Dentre as mudanças mais visíveis estão as janelas traseiras bipartidas (incorporadas em 1937 pela Reutter), a tampa do motor e do capô, e as portas com abertura normal, além dos estribos (os modelos de teste ficavam muito sujos nas estradas mais precárias).
Com a finalização do projeto, máquinas e ferramentas foram também trazidas dos Estados Unidos. Cerca de quarenta e quatro modelos em metal dessa nova série (VW38/39) foram então fabricados, para altos executivos e para fins de propaganda e exibição.
Devido a um pedido de subsídio que a RDA fez, e à oposição de Porsche a este pedido, a RDA acabou rompendo com o projeto do Volkswagen. Ele estava convencido de que com um sistema bem planejado de produção em massa, poderia construir o carro ao preço sugerido e sem a necessidade de um subsídio.
Foi fundado então já em 1937 a Gesellschaft Zur Vorbereitung des Deutschen Volkswagen, GmbH (GeZuVor), em português, "Sociedade para a Produção do Automóvel Popular Alemão", ficando responsável pela produção do carro.


O carro foi batizado oficialmente de KdF-wagen, e a KdF decidiu que cada carro seria vendido por um sistema em que o interessado deveria pagar cinco marcos por semana e receber o carro apenas depois de completar todos os pagamentos (parecido com o sistema de “consórcio" que existe no Brasil). Apesar de não saberem exatamente quando o carro ficaria pronto, cerca de 175 mil alemães aderiram ao plano, a um preço de 990 marcos (no total), e era equipado com motor refrigerado a ar, sistema elétrico de seis volts, câmbio seco de quatro marchas, que até então só se fabricavam carros com caixa de câmbio com no máximo 3 marchas.

Em 26 de maio de 1938 foi colocada a pedra basilar da fábrica, com a presença do próprio Hitler. Mais de setenta mil pessoas participaram da cerimônia. O evento grande cobertura da mídia alemã, gerando repercussão internacional, a ideia do Hitler era exportar o carro para vários países. (o que acabou ocorrendo anos depois, mais a frente você vai descobri como isso aconteceu)

A esquerda de terno preto Ferdinand Porsche e a direita Hitler
Em 15 de agosto de 1940 o primeiro KdF Wagen deixou oficialmente a linha de produção, agora com nome interno "VW Typ 1". Era azul escuro/acinzentado, assim como seriam todos os KdF vendidos.
A Segunda Guerra
Durante a Segunda Guerra mundial, mais especificamente entre 1939 e 1945 grande parte da produção da Volkswagen foi destinada a guerra, assim a produção do fusca aconteceu em pequenas quantidades sendo que até 1944 cerca de apenas 640 kdf- wagen foram produzidos e todos esses destinados a elite do partido nazista, e quem havia pago ‘o consorcio” ficou chupando dedo até que a guerra terminasse e a produção do fusca voltasse a ser o foco principal. Mas o que foi produzido pela vw no período de guerra? Bom nessa época foram produzidos fusca especiais para o exército alemão e esses sendo bem diferentes d aversão civil, outro veículo produzido foi o Kübelwagen, uma espécie de jipe feito sobre o chassis do besouro e que era destinado também as forças militares.

Vw Kubelwagen
Pós Segunda Guerra
Com o fim da terrível segunda guerra mundial, a Alemanha estava em ruinas e ainda foi dividida em zonas que ficaram sob controle dos aliados. A zona em que ficava a fábrica da Volkswagen, chamada de "Cidade KdF”, acabou sendo rebatizada após a guerra com o nome de Wolfsburg, ficou na zona controlada pelos britânicos. O comando da fábrica ficou nas mãos do Major Ivan Hirst, que se tornaria um apaixonado pelo Fusca.
Os britânicos, sem saberem exatamente o que fazer com a fábrica, acabaram por reativar a produção em agosto de 1945, para produzir carros para as forças de ocupação e para o serviço público alemão. Apesar dos intensos bombardeios sofridos pela fábrica durante a guerra, grande parte das ferramentas haviam sido movidas para os porões, tornando a retomada da produção algo relativamente simples. Datam deste período algumas variações interessantes, como pick-ups e furgões, utilizadas em serviços públicos como hospitais e correios.
No entanto, os britânicos não queriam administrar para sempre a fábrica e tinham de encontrar uma forma de passá-la para o governo alemão. A solução foi chamar o antigo dirigente da RDA, e inimigo do Fusca nos seus primórdios, Heinz Nordhoff, para assumir a fábrica. Nordhoff assumiu o cargo em janeiro de 1948, com carta branca do Major Hirst, e ficou no cargo até sua morte em abril de 1968. Logo Nordhoff percebeu que a única forma de expandir a fábrica, e gerar importantes empregos para os alemães no pós-guerra, era exportar os Fuscas, particularmente para os Estados Unidos. Nos Estados Unidos os Fuscas se tornaram uma paixão (assim como se tornariam no brasil).

De fracasso a carro mais vendido do século XX
O Fusca não foi sempre o mais barato dos carros, como pode-se pensar, principalmente na Europa, e de fato vendeu pouco nos primeiros anos de importação/produção na maioria dos diversos países onde a Volkswagen se instalou. Em 1949, por exemplo, a Volkswagen firmou um acordo com a americana Chrysler para usar a rede de concessionárias desta última para vender o Fusca. No ano inteiro apenas dois carros foram vendidos nos Estados Unidos.
As razões para esse início tímido variam. Alguns países tinham um embargo contra produtos alemães (uma fábrica na Irlanda foi construída para contornar esta situação), e a moeda, que até 1948 era o Reichsmark, atrapalhava um pouco a economia e, por tabela, a fábrica. Sem a vantagem de uma produção em larga escala o custo do carro não seria viável. E, além disso, os consumidores estavam acostumados a diferentes padrões de produção, e estranhavam muito a configuração diferente do carro, com seu motor traseiro e sua forma arredondada, e refrigeração a ar.

Mas logo que as dificuldades econômicas foram superadas, rapidamente a fama de "indestrutível" do carro começou a se disseminar, ajudada pela mecânica simples, pela oferta e esquema de distribuição de peças sobressalentes e, principalmente, pelo marketing da Volkswagen, que soube capitalizar sobre a resistência do carro.

Exemplo do marketing feito pela Volkswagen no mercado americano na década de 1960
Logo o Fusca dominou sua fatia de mercado na maioria dos lugares onde foi lançado, ajudado pela precariedade dos concorrentes diretos e pelo boom de crescimento dos países vitoriosos na II Guerra. A Volkswagen aproveitou para expandir a linha de veículos (todos ainda a ar), como a Kombi, o Karmann Ghia, Variant, etc. Além disso a facilidade da mecânica permitia alterações personalizadas, abrindo caminho para adaptações feitas por empresas independentes – como conversíveis, alterações mecânicas, entre outras.
Essa versatilidade de projeto permitiria à Volkswagen diversificar sua linha aproveitando a plataforma e/ou componentes do Fusca.
O sucesso do Fusca evidentemente colocou a Volkswagen em posição privilegiada. Entretanto esta posição era frágil, uma vez que estava largamente baseada apenas em um carro - e qualquer decisão errada feita no modelo poderia levar ao colapso da firma inteira. Para piorar a situação, após a guerra a Tatra processou a Volkswagen pela quebra de várias de suas patentes. A questão foi resolvida fora dos tribunais em 1961, com uma cifra que acabou prejudicando os investimentos na renovação do Fusca durante a década seguinte.


Tais fatores impediriam a Volks de realizar qualquer mudança radical no carro - não que ela não tenha tentado. Vários protótipos chegaram a ser testados como o EA 97/1, uma clara tentativa de atualizar o carro nos anos 1950. Outros protótipos visando substituir o carro foram criados, e alguns ganharam as ruas como modelos de produção paralelos ao Fusca - caso da Brasília brasileira, por exemplo. Uma versão "modernizada" do carro até ganharia discretamente as ruas na década de 1970 - conhecida como modelo "1303",[5]contava com suspensão frontal tipo MacPherson, para-brisa envolvente, painel protuberante e mais espaço no porta malas.


Propaganda do Vw 1303 com as alterações que o tornaram dinamicamente melhor
Porém nenhum conseguiu superar as vendas do Fusca (a Brasília chegaria a fazê-lo no Brasil, mas já no final do ciclo da linha a ar). A popularidade do Fusca só aumentava, e em 1973 ocorreu o auge da popularidade e produção, com 1,25 milhões de unidades produzidas no ano.
Entretanto, o fim da linha já estava a caminho desde os anos 1960. A linha "a ar" não duraria para sempre, e o fluxo de caixa parecia não permitir investimentos em novas tecnologias. A solução seria comprar a tecnologia necessária para novos carros, ao invés de investir em pesquisa. Assim, utilizando o pico de vendas de seus modelos "a ar", a Volkswagen comprou a rival Auto Union, formada pela fusão de famosas marcas alemãs (a DKW, a Audi, a Horch e a Wanderer, além da NSU). O extenso know-how em motores refrigerados a água dessas empresas permitiria a renovação total da linha VW, garantindo o futuro da empresa após o fim das vendas dos modelos "a ar".
Embora de tímida a princípio (o primeiro Volkswagen "a água", o K70, foi um fracasso), a nova linha começou a se estabelecer em 1973, com o lançamento do Passat. Se a idade do Fusca já começava a gerar dúvidas, a aposta da própria Volkswagen em uma linha refrigerada a água só serviu para ressaltar ainda mais a idade do carro. Já nos anos 1970 a produção começou a cair, sendo encerrada na década de 1980 em todo o mundo - menos no México, onde sua aceitação entre os taxistas deu-lhe uma sobrevida surpreendente, semelhante ao que aconteceu no Brasil com o Volkswagen Santana. Porém, novas leis de emissão mexicanas decretaram o fim do carro em 2003, e o último carro foi enviado para o museu em Wolfsburg.
.No geral, o multiuso e indestrutível projeto de Porsche, as peculiaridades da economia do pós-guerra, o sucesso das iniciativas de Nordhoff, incluindo peças de publicidade criativas e divertidas, somado ao charme do "carrinho", acabaram tornando o Fusca o carro mais popular da história do automobilismo, superando em 1972 o recorde do Ford modelo T, ao comemorar a produção de 15 007 034 unidades. Com um número final recorde de 21 529 464 Fuscas produzidos no total (não contando os outros modelos a ar ou o New Beetle), o Fusca é o modelo de carro mais vendido no mundo, mantendo basicamente o mesmo projeto (se for considerado apenas as vendas por marca, o nome Corolla já vendeu mais de 30 milhões de carros, mas de várias "gerações" diferentes).
No próximo post vamos abordas a história do fusca no brasil e de como ele se tornou o carro mais popular e amado do país. Até a próxima!


Por YBS
Kommentare